segunda-feira, 10 de março de 2008

E se dependesse só da chuva?

Este post não estava previsto. Mas acontece que quem tem tido paciência para ler os bocados de prosa que por aqui vou deixando, por vezes me questiona sobre as soluções que preconizo para alguns dos temas que tento abordar. Foi também o que sucedeu nesta última série, sobre educação ambiental ( EA).

Portanto, e para que não se diga que contorno a questão desculpando-me com a necessidade de não cair em generalizações, tentarei explanar sobre um exemplo concreto depois de recapitular algumas premissas que julgo deverem presidir à abordagem da EA.

Antes de mais gostava de afirmar o meu completo desacordo com a institucionalização da EA.

No meu entendimento, a EA não pode ser vista como mero assunto de ensino formal em ambiente escolar. Não faz muito sentido passar uma semana a falar ao menino dos problemas quantitativos da água potável, quando a prática lá de casa e da rotunda municipal adjacente se pautam pelo esbanjamento sistemático. Também não se vê grande futuro no discurso sobre a necessidade de respeitar o ambiente natural de vida das espécies em geral, quando o papá mantém ciclídeos do lago Malawi no aquário, e os programas de fim de semana alternam entre visitas ao oceanário, ao jardim zoológico ou a umas zebras que pastam algures no Alentejo.

Por isso gostava de deixar clara a minha oposição à tendência para encarar a EA de base como temática disciplinar a ser promovida pela escola. E isto porque não entendo a EA como “matéria” mas como “método” e como “ética”. Porque o facto é que boa parte das “matérias” que importam à EA até são abordadas nos conteúdos disciplinares. A questão está na forma não integrada e acrítica como é feita essa abordagem.

Pelas mesmas razões, não vejo a EA como questão cuja abordagem careça de equipamentos específicos, tendência que parece generalizar-se. O “equipamento” de EA ideal é o contexto concreto da vida quotidiana. O caso é que todas as oportunidades são boas para nos ajudar a compreendermo-nos como agentes e produto de interacções complexas, não apenas com o meio ( stricto-senso) mas com o outro ( lato-senso) que também integra e formata o meio. Assim, é curto falar da História sem que se perceba o que a conflitualidade entre nações significa na perspectiva do acesso a recursos sempre escassos, ou que ao “brilho” de certas civilizações se encontram por norma associadas formas nem sempre brilhantes de apropriação e uso de recursos alheios. É curto falar da Geografia sem que se perceba que ela reproduz o investimento de gerações de humanos na tentativa sempre inacabada de domesticação da energia. Como não faz sentido o discurso conservacionista que remete para uma utopia do natural que nunca existiu. Os putos têm que perceber cedo que, sendo verdade que as borboletas são muito bonitas, não é menos verdade que antes de elas voarem houve lagartas que comeram as couves da vizinha. Têm de perceber que alguma coisa a vizinha tem de fazer para colher algumas couves, sob pena de não haver caldo verde à hora do jantar, pois as couves não “crescem” nos hipermercados. Claro que, se possível, importa também que saibam que a vizinha não tem necessariamente de recorrer a um insecticida sistémico de classe I que mata as lagartas das couves, é verdade, mas deixa moribundo o pássaro que as come, avaria os intestinos ao gato que comeu o pássaro, e com um pouco de falta de sorte ainda leva o marido da vizinha às urgências hospitalares.

Sendo assim, a abordagem da EA que preconizo é a transversal e não a disciplinar. Ela pode ( deve ) ser trabalhada na escola dentro de quadros pedagógicos como a "àrea de projecto" ou o "projecto curricular de turma". E de preferência em ciclos subordinados a grandes áreas temáticas que seja possível trabalhar a partir das pequenas coisas do quotidiano dos alunos, pois em todas as nossas actividades existe um tipo de interacção num ecossistema concreto.

Mas vamos lá aos exemplos em meio escolar.

Um ciclo temático subordinado à água ( um problema de consumo com impactos significativos em clima mediterrânico – o nosso ) que tenha por objectivo a noção de condicionalismo geográfico, pode ter como ponto de partida uma proposta de trabalho sobre o sistema de rega do jardim da escola. A água que aí se utiliza como chega até à escola ? E estamos dentro de conteúdos disciplinares dos fluidos: secções, caudais, pressões, perdas de carga. E vem de onde ? Das estações de tratamento e estamos de regresso aos universos da matemática para avaliar a dimensão dos reservatórios ( volumes ) da física ( densidades, filtros ) e da química ( composição, tratamento). E onde foi captada ? Nas barragens ( bacia hidrográfica ) e nos furos de captação ( geologia e geomorfologia ) e chegamos à pluviosidade ( como e onde se mede e representa ? ) ao clima ( que também se caracteriza em função da pluviosidade, e percebe-se que entre a chuva que cai e a que se aproveita - recurso renovável - existem diferenças), para voltarmos às árvores exóticas cuja existência no jardim da escola em clima mediterrânico implica um sistema de rega porque … não estão adaptadas a um ecossistema ( noção concretamente ilustrada por oposição à vegetação autóctone ) que tem na conjugação da estação seca com a estação quente uma das suas limitações climáticas! Chegámos assim à noção de condicionalismo geográfico que é central em EA.

Uma questão ambiental sobre esta matéria? Seja : “Se dependesse unicamente da chuva para suprir as suas necessidades de água anuais, no Algarve, que tipo de estruturas e de que dimensões iria necessitar? Justifique.”

Ainda no caso da água, toda a história do mediterrâneo que se habita foi desenhada sob o seu signo. E isso mesmo pode ser conceptualizado com qualquer dos pontos de partida que nos fornece a realidade concreta da paisagem da comunidade em que se implanta a escola. Há uma história da água que é fundadora da geografia humana. Ela esteve presente na origem e mantem-se viva na toponímia de muitos lugares. Apenas “desapareceu” quando finalmente chegou às torneiras de toda a gente. Mas como não desapareceram os condicionalismos concretos ao seu uso ( uma pluviosidade, escorrência e infiltração razoavelmente previsíveis ) ela pode ser “redescoberta” potenciando nesse percurso a compreensão do nosso papel na sua gestão.

Portanto, teremos de ser capazes de fazer com que um tema susceptível de ser tratado como integrador de conhecimentos e portanto de construir EA, como a água, não se limite aos estafados estereótipos abstractos dos slogans da praxe ( “a água é vida ! Para não faltar, vamos poupar !...) ou às evidências da sua necessidade na nutrição animal ou vegetal ( “sem água não podemos viver…e as plantas morrem !!! ). Informação como a da % de água que se gasta no mundo com a agricultura é coisa perfeitamente irrelevante (e que pode mesmo ser profundamente demagógica) porque dissociada de cada condicionalismo geográfico concreto não tem qualquer significado !

Isto para concluir que sendo um processo e não um fim, à EA importa menos um conjunto desligado de informação abundante, dispersa e descontextualizada, mesmo que correctamente papagueada em resposta a perguntas impossíveis, que a capacidade construída e consolidada de apreciar qualquer acontecimento.

Por isso não se entende que uma escola de onde se avista a Ria Formosa precise de organizar excursões ao oceanário de Lisboa para falar de ambiente marinho, ou que uma outra cujas traseiras dão para hortas precise de promover visitas a uma “quinta pedagógica” (reinvenção dos museus ?) para explicar in situ o que é um ecossistema agrícola. A boa prática pedagógica em EA potencia os contextos, usando-os como âncoras para o conhecimento estruturado. Convenhamos que para desenvolver o tema da biodiversidade ao nível do 9º ano, usar Madagáscar como exemplo é no mínimo…rebuscado, se não se soubesse que bastas vezes estas "fugas para a frente" são promovidas pela falta de domínio das matérias. Sem ele, não é possível articular o conhecimento em relação concreta com o imediato tangível !

26 comentários:

A Comunidade disse...

http://www.portaldeambiente.com/gen.pl?sid=pa.sections/190

Anónimo disse...

Ficam-nos algumas dúvidas sobre questões funcionais, mas no essencial compreendemos a proposta de abandonar as “campanhas publicitárias” e usar temáticas ambientais como eixo para o desenvolvimento transversal de conteúdos curriculares. Desse modo não só temos casos de estudo concretos para o ensino disciplinar, como durante o processo de integração dos conhecimentos se interioriza o “lado ambiental”. Concordamos com essa estratégia de abordagem, e reconhecemos que se ela não é mais potenciada é também porque dificilmente os professores colaboram entre si para articular nesse sentido .

No exemplo que junta, a questão que coloca conduz de facto à abrangência que sugere. Mas sabe que já se gerou forte polémica aqui na salinha ? É verdade ( risos ), pois as opinião dividem-se entre os que acham que os cálculos devem ser feitos para o ano inteiro e os que defendem que basta que digam respeito ao período seco do ano! Não quer desempatar ?

Obrigados.

Matilde and Friends

Manuel Rocha disse...

Osvaldo,

Obrigado pelo link !


Matilde,

Tenho uma sugestão: vocês apresentam a v solução, os leitores que o quiserem a deles, e vamos discutindo os resultados. Acha bem ?
:)

Anónimo disse...

Ehehe !

Muito bem !

Nós diriamos que uma "água" de um telhado com cerca de 100 m2 e um reservatório com cerca de 25 m3 seriam suficientes.
Um cidadão que não seja exageradamente gastador não precisará de mais que 100 l de água por dia. Num ano normal no Algarve, a precipatação excede os 300 l por m2, mas o depósito tem que ser suficiente para a água que vai necessitar durante o periodo seco, que se pode estender de Maio a Setembro.

Como foi que nos saimos ?

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Subscrevo muitas das ideias que defende, especialmente a sua estratégia transversal de abordagem da EA.

Manuel Rocha disse...

Claro que se sairam muito bem, Matilde !

Ficam-me duas pequenas dúvidas:

- A precipitação que consideraram está em linha com a média ou com a média das minimas ?

- Essa precipitação distribui-se de forma regular durante o periodo de maior probabilidade de chuva que consideraram ?

Blondewithaphd disse...

Além de escrever muitíssimo bem tem, também, umas ideias de grande lucidez. De facto, exemplificar conteúdos que se querem quotidianos com Madagáscar é uma daquelas epifanias só advindas de mentes de génio.
Já agora, a pergunta parola da praxe (vinda de uma maior parola): EA é matéria curricular nas escolas ou não passa de uma intenção?

alf disse...

a Educação ambiental, parece-me, deverá começar por fomentar o amor pela natureza; e em parte creio que se faz isso. Eu acrescentaria umas excursões a locais particularmente belos, mesmo sem nenhum animal exótico. E viver na natureza parece-me óptimo para despertar a consciência para a importância de pequenas coisas - o acampamento da Páscoa é capaz de ser uma coisa útil...


Há algumas confusões quando se fazem certas contas. Por exemplo, acerca da poupança de água. A água vem do céu, inflitra-se nos solos, faz os rios, vai para o mar, evapora-se. A rega não "gasta" água, nós não "gastamos" água, a água não se gasta. A questão começa por ser a de saber se a água disponivel em determinado território é excedentária ou deficitária para o uso que de la fazemos. Nós "usamos" água, não a "gastamos".

Qual é o problema?

Por exemplo, para "poupar" água usamos máquinas de lavar loiça de baixo consumo de água. Como é que elas lavam? Usando detergentes muito agressivos. Altamente poluidores.

Afinal, são os detergentes que verdadeiramente "gastam" água. Menos detergente e mais água "gastaria" muito menos água... embora "usasse" mais. Estão a ver a diferença?

Tiago R Cardoso disse...

o Manuel vai me desculpara análise simplista do texto, mas este está muito bom.

Estava mesmo, mesmo para entra nessa da rega não gastar agua, de nós não gastarmos agua, mas dada a hora volto com mais calma.

Entretanto tenho de me ir confessar, é que hoje andei de automóvel, ou seja polui e como agora é pecado...

Tiago R Cardoso disse...

Voltei para deixar um link interessante, bem depende do ponto de vista, mas que está giro, isso está.

http://sol.sapo.pt/PaginaInicial/Sociedade/
Interior.aspx?content_id=84603

Rita disse...

Olá Manuel,
Espero que encare esta crítica como participativa e construtiva.
Acho que devia ter-se informado melhor antes de apontar o dedo às Olimpíadas do Ambiente. São exactamente o tipo de actividade "transversal" que não faz parte do programa mas que entra nas escolas através de uma equipa que se disponibilizou para sensibilizar os míudos para as questões ambientais. Já que o Ministério da Educação não faz o seu trabalho. Além de existirem questões adaptadas ao programa escolar, existem perguntas que só sabe mesmo quem tiver estudado para as Olimpíadas, daí os alunos inscritos passarem um bom tempo à procura de informações sobre o ambiente antes das provas, orientados pelos pais e por professores. Por exemplo, uma colega minha convidada para elaborar perguntas para os testes recusou porque queria ajudar o filho a estudar para a prova. De outra maneira, um puto do 7º ano nunca saberia o que é o IUCN, porque é que os pandas estão em extinção ou porque é que os linces saíram de Portugal e só já existem em Espanha. Aposto que a maior parte das pessoas que vem aqui também não sabe.
Outra parte descabida da sua crítica foi ter descontextualizado as perguntas. Depois de ter publicado o mesmo texto em Maio/2007 no Barlavento e ter sido corrigido por escrito pela Comissão das Olimpíadas, não foi revelador de boa fé repetir a crítica. Ou não percebeu ou não quis perceber a resposta que foi enviada pelas Olimpíadas no ano anterior. Os alunos que no ano passado foram à final, tal como os alunos que chegam à final todos os anos, ganham um fim de semana de formação ambiental numa zona protegida em Portugal. No ano passado calhou exactamente à RIA FORMOSA, que eles foram visitar. (Acho que o Manuel sugere isso?Parece que a equipa das Olimpíadas se lembrou primeiro..) E depois tiveram actividades de formação no Zoomarine, onde não assistiram às catatuas a andar de bicicleta, mas visitaram a parte de educação ambiental. Sabia que no Zoomarine há um laboratório de lesmas marinhas que produzem substãncias com capacidade de combater certo tipo de cancro? Os míudos que chegaram à final ficaram a saber. A sua opinião do Zoomarine parece baseada apenas naquilo que é mostrado pela TV, mas isso não é culpa do Zoomarine e sim dos media. Já agora, se se der ao trabalho de ler o regulamento das Olimpíadas deste ano, vai ficar a saber qual o local onde os míudos da final vão ter formação ambiental in situ.
E se o seu vizinho não fez publicidade ao facto de ter recuperado e libertado um noitibó, acho que devia ter feito. Haveria mais gente motivada a seguir-lhe o exemplo. Graças à divulgação de recuperação de aves feita no Blog dos Bichos, eu deixei de olhar para os passarinhos caídos como casos perdidos e passei a dedicar-lhes tempo e papa de canário até eles poderem ser libertos.
Cumprimentos:)

Anónimo disse...

Bom Dia!

Comento apenas para contestar uma nota deixada numa caixa de comentários segundo a qual é graças à equipa das Olimpiadas do Ambiente que os miúdos das escolas são sensibilizados para as questões ambientais "já que o Ministério da Educação não faz o seu trabalho"( sic ).

Está mal informado o comentário. Não é verdade.

No Algarve, decorre pelo menos desde 2001 um Programa Regional de Educação Ambiental sob a égide da Direcção Regional de Educação.

Um trabalho meritório que envolve acções de formação de professores e acções concretas com alunos.

No seu âmbito já foram organizadas a "Operação Lágrimas Negras" e os "Guardiões da Agua do Sul", este em cooperação com a Andaluzia.

As acções de formação que nos têm sido disponibilizadas como professores, têm tido entre outro o mérito de nos ajudar a romper com a abordagem clássica e pouco consequente dos problemas ambientais, ao contrário do formato proposto pelo projecto das Olimpiadas. Ou seja, também sou capaz de formular perguntas que tais ( de preferência com melhor recorte pedagógico, dado que algumas são amálgamas de conceitos ) e de preparar para as respostas os meus alunos. O problema é quando lhes peço para olharem para o que os rodeia e identificarem um ecossistema ou um impacto de actividade sobre ecossistemas.

Uma última nota sobre parques zoológicos em geral: não levo lá nem os meus filhos nem os meus alunos.

Cumprimentos.

Florbela

Rita disse...

Olá Florbela. Eu não disse que é "só" graças à equipa das Olimpíadas que os alunos são sensibilizados para os problemas ambientais, mas a sua resposta dá a entender que foi isso que percebeu. Ainda bem que a DREA se mobilizou para as actividades que refere. E no resto do país? Faz mal uma actividade a mais? A sua opinião sobre o formato das Olimpíadas é a sua opinião. Sabe que muitas das perguntas são feitas por professores, e têm o objectivo de conter no enunciado algo que também ensine os alunos? A comissão final que escolhe as perguntas das Olimpíadas também é composta por professores, nem fazia sentido de outra maneira. Eu contribuí com perguntas sobre riscos inerentes aos OGM, que é a minha área de trabalho, e várias foram recusadas por não terem um formato adequado.
A descontextualização de uma parte das olimpíadas como o Manuel fez parece que deu origem a uma onda anti-olimpíadas do ambiente. Os portugueses são como estopa à espera de lume, só precisam que lhes dêm um motivo para mandar abaixo qualquer iniciativa, nem tratam de procurar a verdade dos factos por iniciativa própria. E para quem trabalha na defesa do ambiente, tanto separatismo começa a cansar porque só destrói aquilo que demora anos a construir.
Já agora, acho bem que não leve os seus filhos, alunos ou outras crianças da família a parques zoológicos. A minha mãe, professora, nunca levou, e eu faço o mesmo. Circos incluídos na lista negra. Mas se eles se inscreverem para participar nas Olimpíadas do Ambiente, então vão ter que pesquisar sobre outros ecossistemas mundiais que não o Português e vão ficar a saber o que são lémures, pandas, lamas e zebras sem terem que ir a parques zoológicos ou ao circo. Até ficam a saber porque é que esses bichos não devem estar no circo. E ficam também a saber que existe um mundo para além do trajecto que fazem casa-escola, com locais e espécies fantásticos, e que precisa de protecção.

Rita disse...

bluegift,

O seu comentário é tão despropositado em relação ao que eu escrevi que quase nem tenho resposta para ele, senão mandá-l@ ler o que escrevi atrás e dizer-me:
- onde é que eu disse que um comentário seja de quem for era destrutivo?
- tal como não há que dizer sim a tudo, também não há que dizer não a tudo - foi isso que eu critiquei no post do Manuel que mandou completamente abaixo as Olimpíadas, descontextualizando 2 perguntas. Com essa táctica, até eu vendia OGMs no Bolhão.

Além disso, não faço parte das Olimpíadas por isso não depende de mim que elas melhorem - fica a saber que pessoas que trabalham em projectos ligados ao ambiente são convidadas a escrever perguntas sobre a sua área de trabalho.
Já agora: eu falei sobre uma atitude do Manuel, não sobre o Manuel em si. É muito fácil partir do criticar uma atitude para o ofender a pessoa inteira. Entre gente civilizada há discordãncia de opiniões mas vive-se com as diferenças. Por isso se discorda de mim tem que se referir áquilo que eu disse e não à minha pessoa. Guarde para si as suas críticas mal educadas tipo "melhorar a capacidade de encaixe", porque não lhe reconheço autoridade para criticar a minha pessoa.

Manuel Rocha disse...

Blonde,

Obrigado pelo cumprimento.
Sobre a EA na escola, tanto quanto julgo saber não existe como “disciplina”, mas como parte de disciplinas onde se tratam matérias que se identificam como de EA: poluição, aquecimento global, biodiversidade, buraco do ozono, desflorestação da Amazónia, reciclagem, por aí. Existe também pelo menos um programa regional. O PREAA, a que já me tinha referido num post anterior ( “Operação lágrimas Negras” ). Percebe-se que há preocupação com a temática e isso é bom. Há cooperações entre instituições, há recursos envolvidos, há imensas boas vontades. Mas tudo isto é coisa demasiado recente para que tenha tido o necessário tempo de maturação o que, a meu ver, conduz a riscos de desfocagem e a adesões a oportunismos vários que poderiam ( deveriam) ser corrigidos. Vão nesse sentido a essência dos meus contributos.


Alf,
Exactamente !
É pelas coisas concretas e não pelas generalizações abstractas subordinadas ao formalismo dos academismos convencionais, que julgo dever ser conduzida a boa prática de EA .


Tiago,
Certo 
E repare que os “pecados da àgua” no seu Norte não são necessariamente iguais aos do meu Sul. O Alf dá para isso as pistas certas.


Blue,
Concordo contigo. Os conselhos de turma seriam uma óptima forma de concertar a abordagem da EA. Dizes que precisariam de “tempo”. Eu preferia dizer “disponibilidade”…:)

Obrigado pelo link. Lá irei logo que tenha um tempinho.


Rita,
Já cá volto com mais tempo…:)

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Fiquei confuso com o debate. O melhor é regressar ao texto do Manuel. Afinal, o ambiente é mais do que uma troca de impressões! Ou seja, o ambiente não é aquilo que as pessoas dizem do ambiente. Trata-se de fazer a abordagem adequada do ambiente e penso que é nesse sentido que giram as reflexões do Manuel. O resto é treta...

Anónimo disse...

Bem...eu venho dar sequência às questões que o Manuel nos tinha deixado.
Percebemos a sugestão: delimitar bem as "fronteiras" da noção de recurso. É isto ?
Mas e daqui para onde seguiriamos em contexto pedagógico ?

Obrigados.

Anónimo disse...

Agradeço as palavras que a Rita me dirigiu.
Embora não concorde com tudo o que diz, não contestarei porque não julgo que o que teria a dizer viesse acrescentar algo ao debate.
Contudo, outro tanto julgo não suceder com o teor da minha experiência concreta como participante duma acção de formação de porfessores dinamizada pelo PREAA.Decorreu no inicio do Outono de 2003 logo a seguir aos grandes fogos que devastaram as serras do barlavento nesse ano. Com cerca de 30 colegas e sem qualquer outra informação prévia, fomos conduzidos a um local de onde tudo o que se avistava em redor estava perfeitamente carbonizado. Esperava-nos o formador que depois de breves palavras de mera circunstância colocou duas questões quase consecutivas: “ o que foi que sucedeu aqui “ e “porquê” . Devo dizer que divagamos desde a organização dos bombeiros e da protecção civil, passamos pelos pirómanos e pelos interesses ( eventuais ) dos madeireiros, chegamos às alterações climáticas e não sei onde mais, sem que o formador tenha dito mais do que o necessário para incentivar novas intervenções . Passado cerca de uma hora ( e já com alguma desmotivação minha, confesso, pois até ali nada de novo ouvira nem percebera onde se queria chegar como acção de formação em ambiente ), o formador levou-nos por um caminho que pouco depois desembocou num anfiteatro que parecia uma ilha verde no meio da serra queimada: hortas, propriedades e casas arranjadas, pessoas em actividade, sitio vivo e vivido. Repetidas as perguntas, a resposta foi unânime e imediata: “vive cá gente!” O formador nada mais acrescentou.
Devo dizer que esta acção me marcou. Desde logo porque foi claro o significado do conceito “desertificação do interior” quando dele se fala como causa do problema incêndios. Depois, porque como professora tenho tido ocasião de repetir com sucesso este tipo de abordagem de elaboração em contexto, tal como se preconiza no post . Conto apenas o caso das cheias de Albufeira de Outubro de 2006. Visitei com alunos o local e coloquei as questões já referidas. Pensaram, discutiram, divagaram. Depois, levei-os a um vale adjacente que também sofreu a cheia e onde ( ainda ) não havia construção. A resposta foi também imediata: “então…não há casas, não houve prejuízos !” Os trabalhos pedidos aos alunos na sequência desta iniciativa, distinguiram claramente os conceitos de cheia do de inundação. Valorizaram a cheia e criticaram a pouca racionalidade da actividade construção humana em condições de risco objectivo. Ou seja, foram capazes de uma leitura que eu não teria sabido promover fora do contexto daquela peculiar abordagem na serra algarvia, apesar da “bagagem” que antes julgava adquirida em matéria de ambiente. Chamou-me a atenção neste artigo preconizar a mesma linha nada convencional.

Obrigada.

Florbela

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

Ui, o Rui Rio vai acabar com o Bolhão e ainda bem... Contudo, nem no Bolhão existe tanto ataque. PAZ

Manuel Rocha disse...

Matilde,

Sim, julgo que é por aí...:)
Um factor limitante não se define pelas médias dos acontecimentos que o caracterizam mas pelos seus valores absolutos. Se propuser como trabalho a questão "a que cota devo construir a casa no Vale de Santarém para nunca ter problemas de inundações" a resposta que lhe serve não é a definida pela média das cotas das cheias mas pela maior delas registada.
O mesmo raciocinio é válido para a água.
Este género de abordagens que podem ser trabalhadas com informação de várias disciplinas ajudam a consolidar conceitos como factor limitante, capacidade de carga, reserva, etc.



Florbela,

Obrigado pelos comentários.
Se tiver as coordenadas desse seu formador agradecia, nunca se sabe quando um bom contacto nos pode ser útil.

Francisco,

Obrigado pela assessoria...:))
Se quiser seguir a partir daí, pode tentar entrar pela visualização no terreno da área que seria necessária para recolha de água para a população da cidade em que vivem os alunos,

Manuel Rocha disse...

Rita,

Agora nós e peço desculpa pela demora…:)

Em primeiro lugar devo esclarece-la que não me senti minimamente corrigido pela direito de resposta exercido em devido tempo pela ilustre Comissão ( ou por alguém por ela) ao artigo que publiquei. Fui, isso sim, contestado na minha leitura do evento. Corrigido, quereria dizer que teria aduzido na minha argumentação factos incorrectos. Certo ? Não foi o caso, ninguém o afirmou! Se tivesse acontecido ( ou se acontecer ) teria desde logo apresentado as minhas desculpas formais, pois sou crescidinho qb para assumir sem disfarces os meus erros.
A resposta dada e a que a Rita alude, além de me ter etiquetado como “treinador de sofá” ( excelente argumento, que se me cola “por medida” ) não colocou em causa a autenticidade de nenhum dos pressupostos do meu argumentário. De facto, além da evidente preocupação central de saber “quem tinha ousado”, seguiu ( de forma dispersa e auto-vitimizante, diga-se) a mesma linha de argumentação que a Rita está a usar, ou seja, a de que eu estaria a julgar o todo pela parte.

Cabe-me então esclarecer que, embora o artigo que na altura publiquei no Barlavento tenha tido por tema apenas a Final ( e estivesse formatado para jornal ), as minhas objecções à iniciativa são mais amplas. Ou seja, vão do conceito à forma, passam pelo conteúdo, pelo carácter da parceria e, no caso, reportaram ainda ao local do evento. “Descontextualizar”, seria ter feito uma critica a partir de premissas inexistentes. Ora as perguntas que me serviram de mote, estão todas lá, certo ? E não são só duas . Certo? Lamento o inconveniente mas não fui eu quem as inventou. “Descontextualizar”, seria, ainda, supor que ignoro tudo o mais do processo prévio:que não “estive lá”, “ não ouvi”, “não vi”. Bem…suponha que supôs mal, porque não é assim.

Daqui decorre a refutação da insinuação de “má-fé”. Não tenho quaisquer conflitos de interesses com qualquer das entidades ou das pessoas envolvidas no evento. Exerço de forma perfeitamente independente o meu direito à critica, aduzo os meus argumentos, e quem entender por bem refutá-los, disponha. Não coloco ninguém em xeque a titulo individual, não procuro quaisquer benefícios pessoais. Logo, não há da minha parte objectivos escusos, pelo que a insinuação de “má-fé” além de escusada é produzida sem qualquer fundamento.

Dito isto e voltando ao ponto, reitero e justifico o que disse:

1. Associar entidades com o perfil do zoomarine à EA, parece-me perfeito se for para servir de exemplo negativo. A exibição pública de animais selvagens em cativeiro é, a meu ver, uma lamentável base de trabalho. Apresenta-os como criaturas adoráveis ( que são ), muito acarinhadas ( sem dúvida ) , mas fora do seu habitat natural, e omite a relevante informação do impacto no seu local de origem da pressão da procura ( depredação de ninhos e de espécimes vivos, mortalidades na captura e no transporte ) que indirectamente fomenta. Não falo, porque desnecessário, da falta de “preocupação ambiental” do zoomarine quanto à localização da sua estrutura( leito de cheia e solos de baixa inutilizados para parque de estacionamento ) ou quanto ao seu funcionamento ( ignoro o destino que dá às águas de limpeza dos tanques de água salgada, assunto sobre o qual já ouvi muita coisa mas do qual só falaria se suficientemente informado ).

2. O conceito de “concurso” subjacente às ditas olimpíadas, parece-me profundamente errado. Errado porque EA é “atitude” e não “informação”. Naturalmente, aquela não ocorre sem esta. Mas desta não decorre a primeira. E a capacidade de acção efectiva, ou seja, um desempenho consentâneo com os pressupostos estruturantes da consciência ambiental ( sustentabilidade, equidade e ética ), não se traduz na percentagem de respostas certas a questões teóricas ( quaisquer que sejam ) mas na capacidade de reflectir em contextos concretos a acção quotidiana. EA é processo e não produto!

3. Em boa parte os escritos que por aqui tenho deixado justificam porque considero irrelevante para efeitos de EA a informação relativa à pertença ou natureza de um “proboscis” ou de um “espiráculo”. Se entender por bem colocar essa questão numas Olimpiadas da Biologia, não terei qualquer objecção. No caso, porém, preferia que fosse abordado a ambiental questão do desaparecimento das populações dos “ portadores de espiráculos “ e a sua eventual relação com a pressão produzida pelas artes de pesca l nos seus recursos alimentares. Um conjunto de questões interligadas que varra a vida da sardinha desde a idade reprodutiva à respectiva dieta e aos métodos e volumes de capturas ( questão ambiental em ciclo temático e com relevância local ), ou a comparação entre os materiais de construção em uso na região no presente e do passado recente , seriam seguramente abordagens ambientais bem mais estruturantes.

Como vê Rita, justifico o que digo. Em concreto, as Olimpiadas do Ambiente são, quanto a mim, uma iniciativa de “caça grossa” com as “armas erradas”: “canos curtos e chumbo miúdo”. Prejudiciais aos alunos envolvidos ? Acho que não ! Mas neste formato haverá seguramente quem delas beneficie bastante mais. Como não gosto de “insinuações”, esclareço que me refiro à imagem “verde-dinâmico” das entidades que as organizam :activismo neo-verde na sua melhor expressão.
É esta a minha opinião e a minha critica, frontais e desassombradas, como é apanágio duma “casa independente” , pelo que agradeço e continuarei a agradecer contributos de igual índole, como os seus .

Obrigado.

Rita disse...

Viva, Manuel
Obg pela resposta. Só a título de curiosidade, digo-lhe que as olimpíadas não têm qualquer patrocinador financeiro, apenas logístico no que diz respeito a disponibilizar formadores e local para os alunos receberem formação, gente que fala divulgação, etc. Quem faz as Olimpíadas fá-lo como voluntariado fora do horário de trabalho porque não é pago para isso. E olhe que eu gosto tanto de neo-verdes como o Manuel.
Bom. Desta discussão toda gostava de salientar o método usado pela Florbela. Acho que funciona muito bem em educação ambiental e até em qualquer área, sabe-se por experiência que um bom formador é aquele que leva os formandos a chegarem às conclusões por si próprios. O problema geral é aquilo que tantas vezes ouvimos dizer... a escolinha dá formação mas não educação....a educação ambiental devia começar em casa.

Anónimo disse...

Olá !

Lamento mas não tenho o contacto do formador que referi. No entanto penso que será fácil obté-lo junto da DREAlgarve, que foi quem organizou a acção, enquadrada no projecto PREAA.

Cumprimentos.

Florbela

Anónimo disse...

... caramba, que guerra por aqui vai ... em bem digo, se a tal EA que o amigo Manuel Rocha aqui fala fosse uma garrafa da Eugénio de Almeida não era nada disto ...

joshua disse...

Manuel, deves imaginar o prazer que tive em ler este teu texto penetrante e desconstrutor da questão EA, pela consistência amplamente ensinante e demonstrante do teu argumentário.

Mas alguns dos comentários e a polémica subsequentes constituíram, para mim, o que de melhor pude ler nos últimos tempos e somente sobre uma (UMA!) questão geral de evidente fascínio e riqueza.

Não apenas sou um teu leitor como subscritor da respectiva visão das coisas.

Concluo, referindo o valor absoluto de muita literatura quando descreve ou enquadra paisagens e realidades naturais numa perspectiva de apaixonante estesia na sinestesia. Penso que o amor da natureza e da sua justa e inteligente preservação não deveria prescindir do sabor disto e respectivo contributo fomentador de paixão.

Outra coisa rápida é a memória da dimensão proto-ambiental e precursora dos antigos Mosteiros e territórios adjacentes na preservação e equilíbrios naturais.

Grande Abraço no qual desejo envolver, se me permites, a Rita, a Florbela e a Blue e muitos formadores aludidos de clara intuição e saber.

PALAVROSSAVRVS REX

Manuel Rocha disse...

Rita,

Eu é que agradeço:)
Sobre a questão dos financiamentos não tenho nada a dizer. Sei perfeitamente que há de facto muita gente que se envolve nestas actividades tendo apenas em mente o bem comum, e acho isso muito louvável. Também acho louváveis todos os contributos que possam ajudar a potenciar essa disponibilidade. Mas, claro, não somos ingénuos ao ponto de imaginar que no universo empresarial em que vivemos somos todos muito altruistas. Afinal as tabaqueiras não se contam entre as maiores patrocinadoras da investigação do combate ao cancro do pulmão ?


Florbela,

Obrigado pela dica e pelo contributo !



Quint,

Isto é tudo gente com "garra" que não vira a cara a uma boa briga, mas que a seguir não tem quaisquer problemas em esvaziar numa orgia á gaulesa a dita "EA". São susceptíveis, e isso agrada-me !!!E todos percebem que o inimigo são os "romanos"...:)))


Joshua,

Obrigado por tudo e em especial pelo abraço, que retribuo em dobro.

Desse excelente naco de prosa que nos deixaste retive a menção ao papel dos Mosteiros na formatação do espaço em que vivemos. Eles foram também uma vanguarda da ciência e da extensão no mundo rural. Excelente dica para um futuro post...:))

Sabes, embora nunca tenha tido tempo para pesquisar sobre isso, agradava-me de sobremaneira perceber até que ponto muitas das normas que estão incoprporadas nas morais religiosas não correspondem de facto a uma consciência ambiental muito mais acutilante do que nós próprios temos. Esse é outro tema que me fascina...:))