quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Maria Gambina


O sorriso do cartaz é bonito e está identificado como pertencendo a Maria Gambina. O décor da foto, é o de uma lavandaria. O cartaz, identifica-se como tendo sido produzido por um serviço qualquer do Ministério da Educação, está afixado nas entradas de estabelecimentos de ensino e informa quem o lê que a Gambina está ali de engomadeira porque…não concluiu os estudos!
Há Já algum tempo, uma publicidade institucional, tendo por protagonista o sr Carlos Queirós a fazer a manutenção de um recinto desportivo, e que culminava na declaração de que teria sido aquele o seu futuro se não tivesses estudado, tinha-me chamado a atenção. Tirei as minhas ilações mas, distraído, imaginei que se tratasse apenas de um daqueles fenómenos pontuais e efémeros que por isso não mereciam mais considerações. Não é assim. Estamos perante uma vasta campanha que desde logo nos ensina três coisas.
A primeira é que as profissões se dividem em dois grandes grupos: as meritórias, e as outras. A segunda, é que, quem não exerça uma das profissões constantes do inventário das “meritórias”, é um falhado. A ultima, é que a escola tem o monopólio das virtudes necessárias para alcançar o Santo Graal dos tempos modernos - menção na Forbes !
Deve-se então supor que o “sucesso” de personalidades como os Senhores Comendadores Joe Berardo ou Rui Nabeiro, advém dos seus impressionantes currículos académicos? É melhor não, pois pode supor-se mal ! Mas decerto concorda-se que uma formação académica adequada, na medida em que potencie a capacidade de especulação bolsista, a fuga ao fisco ou o contrabando, uma vez que estes são óbvios caminhos de “sucesso”, é meritória. Certo ?
Excepções à parte, está pois assente que, não há “saber”, não há “cultura”, não há “conhecimento”, que seja possível apreender fora do espaço da escola. Nem mérito que possa advir de conhecimentos adquiridos num espaço familiar cuja actividade profissional não se inscreva na lista “das de mérito” ! Portanto, deveremos interiorizar como normal que, na sociedade “desenvolvida” que pretendemos, constituída por cidadãos ”letrados” e de “sucesso”, haja tarefas e ocupações “menores” que, como tal, devem ser exclusivamente desempenhadas por emigrantes ucranianos ou cabo-verdianos. É isto ?
Se é, ocorre-me recomendar aos inúmeros licenciados que temos e que não conseguem encontrar colocação compatível no mercado de trabalho, que é preferível dar o nome para o subsidio de desemprego e ficar em casa do que…ganhar honradamente o sustento numa lavandaria ou na manutenção de um balneário e serem etiquetados de..falhados ! Correcto ?
Assumidamente, estamos pois a evoluir para um sistema de castas. Não me admiraria se a breve trecho a AR resolvesses legislar sobre quem deve ser considerado “intocável”, e respectivos conteúdos funcionais. Já sabemos que os varredores de estádios e as engomadeiras das lavandarias vão lá estar. Resta saber quem se segue. Os balconistas? Os empregados de mesa? Os agricultores?
Pois ! …
Como depreendo que quem afixou o cartaz da Gambina nas escolas, não tenha sido a Senhora Ministra da Educação, e como duvido que seja possível a permanência de cartazes nos espaços públicos das escolas públicas sem o conhecimento e anuência dos respectivos conselhos directivos, deduzo que estes subscrevem o subtexto do cartaz. E como não vejo que os professores que ali exercem a docência se manifestem em contrário, deduzo ainda que também assinam por baixo.
Fico perplexo, e explico porquê.
Então, a mesma classe, a dos professores, que se atira ao Ministério com tudo o que tem, exigindo o respeito que diz lhes ser devido, é a que convive pacificamente com esta absurda falta de respeito pelas profissões operárias?! Que ética é a de quem permite que a sementeira deste inqualificável estigma da marginalidade social seja culturalmente difundido dentro do espaço eminentemente democrático que devia ser a escola ?!
Estamos bem aviados, Maria Gambina !!!

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