quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Teoria dos Erros

Tranquilos ! Não se segue nenhum prato pesado sobre filosofia da matemática. O tempo vai quente e as refeições querem-se leves. Portanto, vamos a uma recensão de lugares comuns sob a égide do erro.

Em comentários ao post anterior falou-se da dificuldade em assumirmos os erros. E eu fiquei a matutar sobre o que é isso dos erros. Pode dar-se o caso de usarmos o conceito de erro de formas perfeitamente abusivas. São muitas as expressões que incorporamos nos nossos raciocínios e nos nossos discursos sem nos darmos ao incómodo de nos determos sobre o seu significado. Sobram as ideias que adquirimos automaticamente. Esse pragmatismo é necessário mas pode redundar em leituras simplistas das coisas, e o conceito de erro é daqueles que se presta a isso.

Raramente separamos a noção de erro de um absoluto omnisciente, como se houvesse uma clarividência transcendente para aceder a tudo o que não se conhece ou ainda não aconteceu. No entanto o erro define-se em relação a uma convenção ou a uma norma, que são coisas mais que terrenas, elas mesmas sujeitas a erro. Daí que seria prudente não separar a ideia de certo ou errado da nossa inteligência das coisas e das limitações que estão sempre associadas a esses processos. A nossa compreensão do mundo e de nós mesmos, é apenas a que é possível. E o erro, mais que uma consequência de uma compreensão imperfeita ou de uma prática incorrecta, é um ingrediente da vida.

Eventualmente, viver-se-ia melhor aprendendo a incorporar os erros nos nossos processos que procurando evitá-los. É que os erros que se cometem na vida não são do mesmo tipo de erro grosseiro que se pode cometer num procedimento químico sobejamente conhecido. Se as mulheres fossem água e os homens ácido sulfúrico, só cometia erros de diluição quem quisesse. O protocolo de diluição do ácido sulfúrico está bem estabelecido. Recomenda que se deve adicionar sempre o ácido à agua e lentamente. Inúmeras experiencias realizadas já demonstraram à saciedade que o contrário explode aquela merda toda nas trombas do criativo. Mas como as pessoas não têm as propriedades químicas e a previsibilidade do comportamento dos ácidos e das bases, é frequente que das respectivas misturas resultem reacções imprevistas. Talvez seja essa a chave para a compreensão da diversidade da vida. Mas temos o mau hábito de valorizar as experiencias bem sucedidas sem reflectir que por cada sucesso alcançado se cometeram carradas de erros. E esquecendo que para empreender pelo desconhecido é preciso algum atrevimento. O atrevimento é o motor da mudança. E o erro é inerente aos processos de quem se atreve.

Portanto, quem é que errou ? A Felismina, que ainda não percebeu qual o papel do sonho na vida? Errou a vida que tem o hábito de se apresentar como um sonho ? Ou errei eu, que já na altura tinha a mania de que o que não calamos é o que melhor nos define ? Errou a minha parceira de deambulações pelas estradas toscanas por só me ter dito que era casada muitos dias depois daquele primeiro abraço que nos demos numa ruela de Orino? Ou errei eu, que acho que não tenho nada a ver com isso ? Se tivesse sabido que ela era casada, que devia eu ter feito ? Fugia, para prevenir posteriores acusações de responsabilidade num processo de divórcio ? Ou pedia uma batina emprestada ao vigário de serviço e assumia-me como paladino do mandamento segundo o qual não posso cobiçar nem perlimpimpar a mulher do próximo, mesmo que ela obviamente me cobice e me queira perlimpimpar a mim e eu não tenha das mulheres o conceito de propriedade do próximo nem conheça o gajo de lado nenhum ?

Assumir os erros ? Sim, mas desde que não se atribua aos erros uma importância que não têm. Sobreavaliados, os erros fazem dos medos cobardias paralisantes, alimentando a crença insana de que a vida é um projecto que é possível executar com a perfeição dos santos. A procura da perfeição é legitima. Mas só me parece saudável se tivermos claro que é duma utopia que se trata. Quem não percebe isso faz da vida uma contrição permanente. Por mim, basta-me colher o que semeio e não fugir da merda que faço. Limpo a que posso, meto o resto na compostagem e é com isso que fertilizo a horta onde irão germinar com todas as imperfeições inevitáveis os dias que ainda estão para me acontecer. Mesmo sabendo que errei, só me arrependo do que não vivi. Quer dizer, prefiro os atrevidos, mesmo que revelem dificuldades em se assumir. Lamento é os idealistas que se deixam aprisionar pelo que “podia ter sido se….”. Esses, como a Felismina, fazem-me pena, pois disfarçam a falta de rasgo numa espécie de masoquismo penitente que é imagem de marca de todas as malfadadas “vitimas do destino”.

6 comentários:

antonio ganhão disse...

Desculpa mas a Felismina tem razão: se é erro, então a culpa é dos outros. Sempre me dei bem com esta linha de raciocínio.

antonio ganhão disse...

Podias desenvolver um pouco mais a teoria de Orino...

Anónimo disse...

:)

Há neste discuso um registo pragmático que me atrai mas, confesso, sempre tive a maior dificuldade em o transpôr para a vida diária. Desgasto-me a antecipar e a tentar evitar os erros. Eventualmente consigo, mas entretanto estou a cometer outros. Uma canseira, lol!

Se a Felismina da sua história é quem eu julgo, não se preocupe, Manuel, ela é mesmo assim. Feitios! ;)

Florbela

Anónimo disse...

"...mesmo que ela obviamente me cobice e me queira perlimpimpar a mim ..."
:-)
kk gaja repudia este pressuposto. Dirá sp k é presunção machista. Sob anonimato n me importo de reconhecer k n será sp assim. Reconhecer isso é que nem pensar. Caso as coisas aconteçam, é sp preferivel invocar o erro. Coisas de gaja. Vcs gajos bem tentam mas n entendem. Nem nós. LOL

joshua disse...

Carpe diem, caro Manuel, errando e seguindo, mais Felismina menos Felismina. Erro é não o fazer! Abraço.

Lino Camacho disse...

Hilariante !!!

Por sinal nunca percebi a razão pela qual o tal mandamento isenta as senhoras de cobiçar os homens das proximas.

Isto não é fácil, nada fácil !